Decisão do STJ afasta aplicação da Súmula 308 para casos de alienação fiduciária

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Em recente decisão proferida no Recurso Especial nº 2130141/RS, o Superior Tribunal de Justiça, em ação declaratória de ineficácia de garantia cumulado com desconstituição de gravame, entendeu pela inaplicabilidade, por analogia, da Súmula 308 aos casos envolvendo garantia real por alienação fiduciária.

A referida Súmula estabelece a ineficácia da hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro como garantia do financiamento da obra perante os adquirentes do imóvel.

Os fundamentos da Corte Superior para afastar a aplicação da Súmula 308 aos casos de alienação fiduciária foram, essencialmente, os seguintes:

a) Os precedentes que fundamentaram a edição da Súmula tiveram como fundamento jurídico essencial a existência de um regime especial instituído pelas normas do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), e não a boa-fé do adquirente, razão pela qual a Súmula não se aplica aos casos de financiamento contratados fora do SFH;

b) Diferentemente da hipoteca, em que o bem permanece na titularidade do devedor, o credor fiduciário detém a propriedade (embora resolúvel) do imóvel, enquanto o devedor fiduciante possui apenas a posse direta do bem, de modo que a venda realizada pelo devedor sem a anuência do credor configura venda a non domino (venda realizada por quem não é dono), que, embora seja válida e eficaz entre os contratantes, é ineficaz perante o proprietário, sendo irrelevante a boa-fé do adquirente;

c) Não é possível estender uma hipótese de exceção normativa, como é o caso da súmula 308, para restringir a aplicação de regra jurídica válida, como o art. 29 da Lei 9.514/97, que exige a anuência expressa do credor fiduciário para que o devedor fiduciante possa transmitir os direitos sobre o imóvel alienado fiduciariamente;

d) É essencial haver segurança jurídica e econômica nos contratos de alienação fiduciária para garantir a estabilidade das relações contratuais entre as partes envolvidas e promover o desenvolvimento econômico e acesso ao crédito de forma responsável;

e) A aplicação da súmula aos contratos de AF pode gerar efeitos prejudiciais aos próprios consumidores, na medida em que os agentes financeiros, percebendo o aumento do risco ao concederem financiamentos para a aquisição de imóveis, podem elevar o custo de crédito com o aumento das taxas de juros e/ou exigir maiores garantias ou até restringir o acesso ao financiamento para certos perfis de clientes, o que pode dificultar o acesso à moradia.

A decisão, embora não tenha sido proferida em sede de recursos repetitivos, representa um importantíssimo avanço para a superação da controvérsia existente há anos, e garante maior segurança aos contratos de alienação fiduciária – instituto criado justamente para assegurar a proteção ao crédito de forma mais eficiente e que vinha sendo desvirtuado pelo judiciário.

Por Carolina Lins