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Hidrogênio verde no universo portuário


Diante de sua notória relevância, já há projeto de lei buscando inserir o hidrogênio verde na matriz energética brasileira e estabelecer parâmetros de incentivo ao uso do hidrogênio sustentável (PL n° 725/2022).

Uma das propostas do mencionado PL, é reconhecer como competência da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), fiscalizar a produção, importação, exportação, armazenagem, estocagem, padrões para uso e injeção nos pontos de entrega ou pontos de saída do hidrogênio.

Considerando a crescente demanda, indústrias de hidrogênio verde vem buscando espaços em áreas portuárias, com Pecém, no Ceará, Suape, em Pernambuco, e Açu, no Rio de Janeiro. A referida procura considera de forma estratégia fatores como a localidade, logística de exportação, existência de Zona de Processamento de Exportação (ZPE), proximidade de polos industriais, além da capacidade da região no desenvolvimento de energias renováveis.

Portanto, não há como se fomentar a indústria de hidrogênio verde sem um planejamento regulatório portuário, através da ocupação de uma área dentro do porto organizado de forma segura. Nesta senda, importante destacar alguns pontos.

Para a identificação da área mais apropriada, considerando os fatores acima, são necessários estudos iniciais, incluindo a viabilidade operacional, logística, ambiental e econômica, além da disponibilidade de áreas portuárias localizadas de forma estratégica.

Primeira etapa é identificação no Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto (PDZ) se há área que pode ser destinada a determinado fim, bem como se está caracterizada como afeta ou não afeta às operações portuárias em exploração indireta, o que irá alterar significativamente o modelo regulatório que poderá ser adotado. Nada impede que, depois de um memorando de entendimento, o PDZ seja ajustado, para posterior aprovação do Poder Concedente.

Conforme Lei dos Portos, a autoridade portuária elaborará e submeterá à aprovação da Secretaria de Portos da Presidência da República o respectivo Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto.

As áreas não afetas à operação portuária são as localizadas dentro da poligonal do porto organizado que, de acordo com o plano de desenvolvimento e zoneamento do porto, não é reservada ao exercício das atividades de movimentação de passageiros, movimentação ou armazenagem de mercadorias, destinadas ou provenientes de transporte aquaviário, incluindo as de caráter cultural, social, recreativo, comercial e industrial.

A definição se o empreendimento de hidrogênio verde, mesmo havendo notória atividade industrial, pode se enquadrar como área afeta ou não afeta às operações portuárias dependerá de uma análise casuística, a depender do projeto e das atividades a serem desenvolvidas dentro do porto organizado, além da previsão e destinação do PDZ.

Assim, caso haja a caraterização como atividade operacional, ou seja, afeta às operações portuárias, restam dois modelos exploratórios que podem ser empregados, considerando ainda o hidrogênio verde como uma possível “carga não consolidada”. Assim, seria plenamente aplicável o Contrato de Uso Temporário, a curto prazo, ou o Contrato de Arrendamento, a longo prazo. Além da possibilidade de contratos paralelos, a depender da forma de passagem, ou seja, da existência ou não de dutos.

Nesta senda, destaca-se de forma breve o Decreto nº 10.672/2021, que regulamenta a possibilidade dispensa de licitação de arrendamento portuário e os procedimentos e condições para o uso temporário de áreas e instalações portuárias localizadas na poligonal do porto organizado, conforme Lei nº 14.047/2020.

Entre os institutos regulamentos pelo Decreto nº 10.672/2021, há a possibilidade de dispensa de licitação de área no porto organizado quando existir um único interessado em sua exploração. Para tanto, basta que a autoridade portuária realize chamamento público e o novo empreendimento possua conformidade com o Plano de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ) do porto.

Além disso, foi regulamentado regime de uso temporário para exploração de áreas e instalações portuárias. Por este, será possível explorar terminal portuário por um prazo improrrogável de até 48 (quarenta e oito) meses.

O uso temporário de áreas e instalações portuárias deve envolver a movimentação de cargas com mercado não consolidado, sendo essa considerada quando a mercadoria não movimentada regularmente no porto organizado nos últimos cinco anos e que tenha demandado, em média, menos de uma atracação mensal no mesmo período. Da mesma forma, essa utilização deverá estar compatível com o PDZ aprovado pelo poder concedente.

Todavia, por envolver atividade industrial, a indústria de hidrogênio pode ser caracterizada como atividade não operacional, ou seja, como não afeta às operações portuárias. Desta forma, o modelo regulatório poderá ser desenvolvido através de um contrato de cessão portuária, conforme Portaria do Ministério dos Portos e Aeroportos no 51/2021.

A cessão deverá estar embasada por estudos simplificados que abrangem a análise de viabilidade técnica e ambiental, que contemplem a apresentação do empreendimento, o valor estimado global e por metro quadrado a serem auferidos pela administração do porto organizado na cessão, quando onerosa; e análise de viabilidade técnica. De acordo com a Portaria no 51/2021, apenas os projetos de grande vulto exigirão a realização de Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA).

Considerando a notória importância para o Brasil, não pairam dúvidas que os portos brasileiros devem acelerar a corrida para o desenvolvimento do mercado de hidrogênio verde em áreas do porto organizado.

Inclusive, não faltam possibilidades para que o modelo regulatório portuário abarque a indústria de hidrogênio verde no Brasil, tanto considerando a possibilidade de contratos temporários ou definitivos, sempre prezando pela segurança jurídica.

A instalação de uma indústria de hidrogênio verde pode ampliar a rede de negócios de um determinado porto, com destaque à exportação, além de suprir a demanda de empresas locais e instaladas no porto e na região. Da mesma forma, o desenvolvimento de empreendimentos sustentáveis segue a linha da Governança Ambiental, Social e Corporativa (ESG) na área portuária.

No mais, nítida a necessidade de celeridade e desburocratização da contratação de áreas portuárias, com vistas a atender o mercado, conforme pontuado, caso haja apenas um interessado, deverá ser aberto chamamento público, com possível dispensa de licitação.

Enquanto se estuda a necessidade de regulação específica, bem como se essa ficará à cargo da ANP, conforme PL n° 725/2022, a regulação para a ocupação portuária já pode ser amplamente aproveitada, inclusive com possibilidade de ajustes no PDZ do porto, caso necessário.

Que a energia limpa possa estar cada vez mais presente em portos brasileiros, bem como ser exportada através do modal aquaviário, fomentando a sustentabilidade no Brasil.

Autor

Ingrid Zanella